domingo, 28 de agosto de 2011

CIDADE DE ÍDOLOS

A História do Cristianismo Através dos Séculos (aula 27)


TEXTO BASE: Atos 17:16-17:34

Ídolos não são características apenas de sociedades primitivas; existem ídolos sofisticados também. Um ídolo é um substituto para Deus. Qualquer pessoa ou coisa que ocupe um lugar que deveria ser de Deus é um ídolo. Cobiça é idolatria. Ideologias podem ser idolatria. Do mesmo modo a fama, riqueza e poder, sexo, alimento, álcool e outras drogas. Pessoas podem ser ídolos – pais, cônjuges, filhos e amigos. As possibilidades incluem o trabalho, a recreação, televisão e propriedades. Até igreja, religião e serviço cristão podem ser idolatrados.

"No passado Deus não levou em conta essa ignorância, mas agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam.". Atos 17:30

A aula foi extraída do guia de estudos bíblicos: O Espírito em ação – John Stott, Editora Cultura Cristã

domingo, 21 de agosto de 2011

William Wilberforce (Biografia VI)

Aula organizada a partir do artigo “William Wilberforce: "Todos vós sois um em Cristo Jesus"” de direitos autorais de RENAS - Rede Evangélica Nacional de Ação Social.
Copyright © 2005-2011.



A História do Cristianismo Através dos Séculos (aula 26)

"O Deus todo-poderoso tem colocado sobre mim dois grandes objetivos: a supressão do comércio escravocrata e a reforma dos costumes”.
TEXTO BASE: Gálatas 6:9

CONTEXTO
No século 18, a Inglaterra detinha o monopólio do comércio de escravos negros. Os meios de transporte eram os mais cruéis imagináveis. Boa parte da população inglesa tirava proveito desse comércio, e o povo, de maneira geral, aceitava a escravidão. Havia aqueles que enriqueciam e, por isso, defendiam com veemência o escravagismo. Mas Deus graciosamente ergueu uma geração de políticos cristãos para lutar contra o que William Carey chamou de "maldito comércio de escravos".

VIDA – PRECIOSA GRAÇA
É surpreendente que nenhum grande reformador da história ocidental seja tão pouco conhecido como William Wilberforce. Ele nasceu numa família nobre da Inglaterra, na cidade portuária de Hull, em Yorkshire, em 24 de agosto de 1759. Naquela época, como hoje, a aristocracia vivia em meio a contradições: nela se encontravam alguns dos grandes benfeitores da nação e alguns de seus maiores corruptores. Wilberforce era fruto dessas ambigüidades.

Após estudar em uma escola em Pocklington, foi aceito em 1776 no St. John's College, na Universidade de Cambridge, onde decidiu dedicar-se à carreira política, tendo sido eleito representante de seu povoado aos 21 anos de idade. Além de repartir o dinheiro que possuía, mandou fazer um grande churrasco para todo o vilarejo, o que lhe valeu um bom número de votantes. Aos 24 anos, já era um político famoso por sua eloqüência e acabou por ser eleito representante de Yorkshire, o maior e mais importante condado da Inglaterra, chegando a Londres cheio de popularidade.

Em 1784, ainda aos 24 anos de idade, partiu para uma viagem a Nice, na França, que traria grande transformação em seu caráter. Levou consigo a mãe, Elizabeth, a irmã Sally, uma amiga dela e Isaac Milner, seu antigo professor primário, e que veio a se tornar presidente do Queen's College, na Universidade de Cambridge. Na bagagem de Milner, Wilberforce viu uma cópia do livro de Philip Doddridge - mais conhecido por ter escrito o famoso hino "Oh! Happy Day" [Oh! Dia Feliz!] -, The Rise and Progress of Religion in the Soul [O começo e o progresso da religião na alma]. Ele perguntou para seu amigo o que era aquilo e recebeu a resposta: "Um dos melhores livros já escritos". Os dois concordaram em lê-lo juntos na jornada.

A leitura desse livro e das Escrituras, acompanhada de conversas com Milner, levaram o jovem político à conversão. Ele declarou em seu diário, em fins de outubro daquele ano:

Assim que me compenetrei com seriedade, a profunda culpa e tenebrosa ingratidão de minha vida pregressa vieram sobre mim com toda sua força, condenei-me por ter perdido tempo precioso, oportunidades e talentos [...]. Não foi tanto o temor da punição que me afetou, mas um senso de minha grande pecaminosidade por ter negligenciado por tanto tempo as misericórdias indescritíveis de meu Deus e Senhor. Eu me encho de tristeza. Duvido que algum ser humano tenha sofrido tanto quanto eu sofri naqueles meses.

Wilberforce começou um programa que durou toda sua vida, de separar os domingos e um intervalo a cada manhã para se dedicar à oração e às leituras espirituais.

UMA LONGA E DURA LUTA
Já de volta a Londres, a vida de Wilberforce tomou novos rumos. Ele considerou suas opções, inclusive o ministério cristão, mas foi convencido por John Newton que Deus o queria permanecendo na política, em vez de entrar para o ministério. "Espera e crê que o Senhor te levantou para o bem da nação", escreveu Newton.
Depois de muito pensar e orar, Wilberforce concluiu que Newton estava certo. Deus o chamara para defender a liberdade dos oprimidos como parlamentar. "Minha caminhada é de vida pública. Meu negócio está no mundo, e é necessário que eu me misture nas assembléias dos homens ou deixe o cargo que a Providência parece ter-me imposto", escreveu em seu diário, em 1788.

Outro que o influenciou fortemente foi John Wesley. Newton e Wesley tinham, além de uma fé vibrante no evangelho, uma forte convicção de que não havia maior pecado pesando sobre as costas do Império Britânico do que o terrível e abominável tráfico de escravos, que Wesley batizara de "execrável vileza".

Bruce Shelley diz que os ingleses entraram nesse comércio em 1562, quando Sir John Hawkins pegou uma carga de escravos em Serra Leoa e a vendeu em São Domingos. Então, depois que a monarquia foi restaurada em 1660, o rei Carlos II deu uma concessão especial para uma companhia que levava 3 mil escravos por ano para as Índias Orientais. A partir daí, o comércio cresceu e atingiu enormes proporções. Em 1770, os navios ingleses transportavam mais da metade dos cem mil escravos vindos da África Oriental. Muitos ingleses consideravam o tráfico de escravos inseparavelmente ligado ao comércio e à segurança nacional da Grã-Bretanha.

“Eu não sou um homem e um irmão?” ("Am I Not A Man And A Brother?") medalhão criado por um partido contra a escravidão, por Josiah Wedgwood, 1787


John Wesley escreveu sua última carta a Wilberforce, em 24 de fevereiro de 1791, seis dias antes de morrer, encorajando-o a executar o plano da abolição da escravatura. Um parágrafo dessa carta diz o seguinte: "Oh! Não vos desanimeis de fazer o bem. Ide avante, em nome de Deus, e na força do seu poder, até que desapareça a escravidão americana, a mais vil que o sol já iluminou".
Diagrama de um navio negreiro, o Brookes, ilustrando as condições desumanas a bordo de tais navios

Foi por conta dessas influências que Wilberforce decidiu dedicar toda a força de sua juventude e todo o talento que tinha a um único objetivo que consumiria toda sua vida: a abolição do tráfico negreiro. Algum tempo depois, num domingo, 28 de outubro de 1787, ele escreveu em seu diário as palavras que se tornaram famosas: "O Deus todo-poderoso tem colocado sobre mim dois grandes objetivos: a supressão do comércio escravocrata e a reforma dos costumes”.

Uma fonte de estímulo nessa luta foi sua participação ativa no chamado Grupo de Clapham (Clapham Sect), constituído de pessoas ricas cujas residências ficavam em Clapham, um elegante bairro localizado a 8 quilômetros de Londres, que apoiava muitos líderes leigos na busca de uma reforma social, liderados por um humilde ministro anglicano, John Venn. Como destacam Clouse, Pierard & Yamauchi, o Grupo de Clapham foi, de longe, a mais importante expressão anglicana na esfera da ação social. Esse grupo de leigos geralmente se reunia para estudar a Bíblia, orar e dialogar na biblioteca oval de Henry Thornton, um rico banqueiro que todo ano doava grande parte de seus rendimentos para a filantropia.

Outros que participavam do grupo eram: Charles Grant, presidente da Companhia das Índias Orientais; James Stephens, cujo filho, chefe do Departamento Colonial, auxiliou bastante os missionários nas colônias; John Shore, Lorde Teignmouth, governador-geral da Índia e primeiro presidente da Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira; Zachary Macauley, editor do Observador Cristão; Thomas Clarkson, famoso líder abolicionista; a educadora Hannah More, além de outros líderes evangélicos. Dentre várias atividades, eles ajudaram a fundar a colônia de Serra Leoa, onde escravos libertos poderiam viver livres.

Clouse, Pierard & Yamauchi dizem: Este grupo uniu-se numa intimidade e solidariedade incríveis, quase como uma grande família. Eles se visitavam e moravam um na casa do outro, tanto em Clapham, como na própria Londres e no campo. Ficaram conhecidos como 'os Santos' por causa de seu fervor religioso e desejo de estabelecer a retidão no país. Vários comentaristas observaram que eles planejavam e trabalhavam com um comitê que estava sempre reunido em 'conselhos de gabinete' em suas residências pata discutir o que precisava ser consertado e estratégias que poderiam usar para alcançar seus objetivos.

Neste grupo, discutiam os erros e as injustiças de seu país, e as batalhas que teriam de travar para estabelecer a justiça.

Os membros do Grupo de Clapham demonstraram a diferença que um grupo de cristãos pode fazer. Eles elaboraram 12 marcas que nortearam seu esforço pela reforma social na Inglaterra do século 19:

1. Estabeleça objetivos claros e específicos.
2. Pesquise cuidadosamente para produzir uma proposta realista e irrefutável.
3. Construa uma comunidade comprometida que apóie uns aos outros. A batalha não pode ser vencida sozinha.
4. Não aceite retiradas como uma derrota final.
5. Comprometa-se a lutar de forma contínua, mesmo que a luta demore décadas.
6. Mantenha o foco nas questões; não permita que os ataques malignos de oponentes o distraiam ou provoquem resposta similar.
7. Demonstre empatia com a posição do oponente, de forma que diálogo significativo aconteça.
8. Aceite ganhos parciais quando tudo o que é desejado não puder ser obtido de uma só vez.
9. Cultive e apóie suas bases populares quando outros, que estiverem no poder, se opuserem a seus projetos.
10. Transcenda à mentalidade simplista e direcione-se às questões maiores, principalmente as que envolvem questões éticas!
11. Trabalhe através de canais reconhecidos, sem lançar mão de táticas sujas ou violentas.
12. Prossiga com senso de missão e convicção de que Deus o guiará providencialmente se estiver verdadeiramente a seu serviço.

Em 1797, Wilberforce publicou um livro intitulado Practical View of Real Christianity [Panorama prático do cristianismo verdadeiro], amplamente lido e ainda publicado, que evidenciava o interesse evangélico na redenção como a única força regeneradora, na justificação pela graça por meio da fé e na leitura da Escritura em dependência ao Espírito Santo, ou seja, numa piedade prática que redundasse em serviço relevante para a sociedade. Nessa obra, ele disse sobre o cristianismo verdadeiro:
Eu compreendo que a marca prática e essencial dos verdadeiros cristãos é a seguinte: que os pecadores arrependidos, confiando na promessa de serem aceitos [por Deus], mediante o Redentor, têm renunciado e abjurado todos os outros senhores, e têm de maneira integral se devotado a Deus. Agora, seu propósito determinado é se dedicar integralmente ao justo serviço do legítimo Soberano. Eles não mais pertencem a si mesmos: todas as faculdades físicas e mentais, sua herança, sua essência, sua autoridade, seu tempo, sua influência, tudo o que desconsideram como sendo seus [...] devem ser consagrados em honra a Deus e empregados a seu serviço.
E sobre o poder e o direito:
Eu devo confessar [...] que minhas próprias [e sólidas] esperanças pelo bem-estar do meu país não depende de seus navios e exércitos, nem da sabedoria de seus governantes, ou ainda do espírito de seu povo, mas sim da [capacidade de] persuasão de todos aqueles que amam e obedecem ao evangelho de Cristo.
NO TEMPO DE DEUS
Wilberforce e seus amigos do Grupo de Clapham também ajudaram a fundar escolas cristãs para os pobres, a reformar as prisões, a combater a pornografia, a realizar missões cristãs no estrangeiro e a batalhar pela liberdade religiosa. Mas Wilberforce acabou por se tornar mais conhecido por seu compromisso incansável pela abolição de escravidão e do comércio de escravos.

Sua luta começou por volta de 1787 - ele já era parlamentar desde 1780. Haviam pedido a Wilberforce que propusesse a abolição do comércio de escravos, embora quase todos os ingleses achassem a escravidão necessária, ainda que desagradável, e que a ruína econômica certamente viria ao acabar com a escravidão. Apenas uns poucos achavam o comércio de escravos errado. A pesquisa de Wilberforce o pressionou até conclusões dolorosamente claras. "Tão enorme, tão terrível, tão irremediável aparentou a maldade desse comércio que minha mente ficou inteiramente decidida em favor da abolição", disse ele à Casa dos Comuns: "Sejam quais forem as conseqüências, deste momento em diante estou resolvido que não descansarei até efetuar sua abolição." Wilberforce falou primeiramente sobre o comércio de escravos na Casa de Câmara dos Comuns em 1788, num discurso de três horas e meia, que concluiu dizendo: "Senhor, quando nós pensamos na eternidade e em suas futuras conseqüências sobre toda conduta humana, se existe esta vida, o que esta fará a qualquer homem que contradisser as ordens de sua consciência e os princípios da justiça e da lei de Deus!". Sua luta custou-lhe dezoito anos de trabalho incansável.

Os feitos de Wilberforce foram realizados em meio a tremendos desafios. Ele era um homem de constituição fraca e com uma fé desprezada. Quanto à tarefa, enquanto a prática da escravatura era quase universalmente aceita, o comércio de escravos era tão importante para a economia do Império Britânico quanto é a indústria de armamentos para os Estados Unidos hoje. Quanto à sua oposição, incluía poderosos interesses mercantis e coloniais e personalidades como o famoso Almirante Horacio Nelson e a maior parte da família real. E quanto à sua perseverança, Wilberforce continuou incansavelmente, anos a fio, antes de alcançar seu alvo. Sempre desprezado, ele foi duas vezes assaltado e surrado. Certa vez, um amigo lhe escreveu, dizendo-lhe que, do jeito que as coisas andavam, "eu espero ouvir dizer que foste carbonizado por algum dono de fazenda das Índias Ocidentais, feito churrasco por mercadores africanos e comido por capitães da Guiné, mas não desanime - eu escreverei o seu epitáfio!"
O Parlamento "The House of Commons" nos dia de Wilberforce por Augustus Pugin e Thomas Rowlandson (1808–11)

O comércio de escravos foi finalmente abolido em 25 de março de 1806. Quando a lei foi aprovada, todo o Parlamento se pôs de pé e aplaudiu Wilberforce por vários minutos, enquanto ele, já desgastado pelos anos, chorava com o rosto entre as mãos.

Ele continuou a campanha contra a escravidão em todos os territórios britânicos, e o voto crucial da famosa Lei de Emancipação chegou quatro dias antes de sua morte, em 29 de julho de 1833.

Por conta da decisão parlamentar, poderosa como era e não querendo ser lesada em seus interesses, a Grã-Bretanha declarou ao mundo que nem ela nem ninguém mais poderia traficar escravos. Além disso, tornou-se a guardiã dos mares. Logo, Portugal e Bélgica, as duas nações rivais, tiveram também de parar com o tráfico, por força do poderio naval inglês.

Um ano depois da morte de Wilberforce, em julho de 1834, 800 mil escravos, principalmente na Índia Ocidental britânica, foram libertos. Em pouco tempo, a maior parte dos países ocidentais aboliria a escravidão em definitivo.

APLICAÇÃO
A vida de William Wilberforce é uma inspiração para todo cristão. A sua conversão genuína e o desdobramento desta fé no seu cotidiano o levou a uma decisão importante, entre ser pastor ou usar seus talentos e dons para promover profundas mudanças estruturais na sociedade britânica para a glória de Deus.

Wilberforce viveu de forma coerente com suas convicções e consciência, sempre as submetendo ao crivo da Palavra de Deus. Ele rompeu com o pensamento perverso de sua geração sobre a escravidão e lutou em prol da justiça e a promoção do reino de Deus. Com perseverança e ligado a Cristo, William mostrou que não há espaço para conformismo e omissão na vida cristã, nos lembrando das palavras do apóstolo Paulo: “E não nos cansemos de fazer bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido” (Gl 6:9) e insistiu novamente aos cristão de Tessalônica: “irmãos, nunca se cansem de fazer o bem” (II Ts 3:13).

MATERIAL UTILIZADO

• CLOUSE, Robert; PIERARD, Richard; YAMAUCHI, Edwin. Dois reinos: a igreja e a cultura interagindo ao longo dos séculos. São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 413-20.
• GUINNESS, Os. O chamado. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 35-43. KERR NETO, Guilherme. O inglês que acabou com o tráfico negreiro.
• Ultimato, n.º 245, mar./1997, p. 28.
• NOIL, Mark. Momentos decisivos na história do cristianismo. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 256-81.
• SHAW, Mark. Lições de mestre: 10 insights para a edificação da igreja local. São Paulo: Mundo Cristão, 2004, p. 203-24.
• SHELLEY, Bruce L. História do cristianismo ao alcance de todos. São Paulo: Shedd, 2004, p. 407-16.
• WESTPHAL, Euler. A ética social na teologia de John Wesley. Vox Scripturae, 7/2, dez./1997, p. 83-97.

Aula organizada a partir do artigo “William Wilberforce: "Todos vós sois um em Cristo Jesus"” de direitos autorais de RENAS - Rede Evangélica Nacional de Ação Social.
Copyright © 2005-2011.


domingo, 14 de agosto de 2011

Anabatismo e Reforma Católica (História da Igreja VII)

Por Pedro Paulo Valente

A História do Cristianismo Através dos Séculos (aula 25)

TEXTO BASE: Gálatas 1:1-9

INTRODUÇÃO
A Reforma Protestante, nome que os historiadores usaram para descrever os movimentos que buscavam corrigir a Igreja do século XVI, caracteriza-se por sua complexidade, pois não houve uma tentativa homogênea de reforma, mas ocorreram diversas ‘reformas’. Assim, geralmente, tais reformas são classificadas como: (1) luteranismo; (2) a igreja reformada, também designada como calvinista, (3) a reforma radical (anabatista) e (4) a reforma católica. Os programas para a reforma da igreja diferem em relação à tradição da Igreja antiga, e dentre elas a posição anabatista é a mais extrema, justificando o seu espírito radical.

NEM CATÓLICO NEM PROTESTANTE
Por José Cristiano de Oliveira Sampaio

Os principais reformadores rejeitavam, de modo geral, as tendências anabatistas, pois viam, com razão, certos perigos advindos da negação de doutrinas cristãs fundamentais. Todavia, não podemos deixar de reconhecer que a Reforma Radical também foi um movimento de renovação espiritual e eclesiástica que, além de negar a validade do batismo infantil, tema ainda discutível, também divergia em vários pontos. Essa é uma das razões porque os radicais permaneceram à margem das igrejas protestantes territoriais. O seu principal direcionamento era uma exacerbação do Sola Scriptura. Como afirma Timothy George (1994), eles desejavam não apenas reformar a Igreja, mas restaurá-la à sua pureza anterior, apostólica; isso, às custas até mesmo das ordenanças do Senhor (batismo e ceia), como advogava Kasper Schwenckfeld, acreditando que esses sacramentos seriam irrelevantes, haja vista que são atos aparentes e não o testemunho do Espírito. Outros questionavam a trindade e os dogmas cristológicos da Igreja Patrística.

Do ramo anabatista, Menno Simons (daí o termo menonitas) foi o líder mais importante, pois era talvez o mais equilibrado naquele grupo. Menno nasceu em 1496, no que é hoje a Holanda, e foi ordenado padre aos 28 anos de idade. Era um pároco fanfarrão. Gastava muito tempo bebendo e jogando cartas. Dizia não ter lido a bíblia até dois anos após a sua ordenação, mas, como os outros reformadores, teve um encontro com a Palavra de Deus e isso, é óbvio, mudou o curso da sua vida. A partir de 1525, enquanto se organizavam as primeiras congregações anabatistas em sua pátria, desatou a questionar o dogma da transubstanciação. Ele relatou que sempre que tomava o pão e o vinho na missa, eles não eram a carne e o sangue do Senhor e pensava que o demônio estava sugerindo isso. Tal idéia o afligiu muito e foi motivo incessante de confissões e penitências. Não se pode afirmar o que fez Menno questionar a missa, porém se sabe que ele havia lido panfletos de Lutero de 1520, nos quais o reformador alemão descrevia a transubstanciação como nada mais que uma invenção humana sem nenhuma base nas Escrituras. No entanto, Menno, dissimuladamente, celebrava as missas, mesmo não lhes atribuindo o valor de sacrifício.

A ruptura definitiva de Menno com Roma demoraria alguns anos. Logo, não mais reconhecia o valor do batismo infantil, mas continuava padre. Um evento, todavia, foi crucial para a tomada de rumo que ele faria. O seu irmão, Pedro Simons, e outros trezentos anabatistas foram brutalmente mortos pelas autoridades locais, após resistirem por uma semana entrincheirados num castelo, em 1535. A partir dessa época, Menno começou a pregar abertamente contra os dogmas católicos que considerava equivocados e, durante quase um ano, tentou fazer reformas na igreja de Witmarsum. Na mesma época, pregava contra o uso da violência praticado mesmo por anabatistas, a ‘filosofia da espada’.

Para todos os radicais, o verdadeiro cristianismo constituía-se em uma experiência pessoal e individual. Nesse sentido, o novo nascimento era um pré-requisito para o batismo. Menno ensinava também que a fé era a resposta do homem a Deus e o que a caracterizaria era o verdadeiro arrependimento e não aquelas práticas externas como jejuns, peregrinações, abundantes ave-marias e pais-nossos. Ele cria que a salvação é pela graça, mas discordava dos outros reformadores quanto à predestinação e à escravidão da vontade nos termos agostinianos defendidos por Lutero e Zuínglio (não conhecia Calvino), pois, entendia que a teologia daqueles reformadores era muito fatalista.
Menno Simons cria que a Igreja de Cristo caracterizava-se por sofrer perseguição, mas não perseguir. Ninguém pode ser compelido a aceitar o Evangelho. Com efeito, o próprio Menno foi duramente perseguido durante toda a sua vida e viu dois de seus filhos e sua mulher morrerem; ele morreu de causas naturais. “Se o cabeça teve de sofrer tal tortura, angústia, miséria e sofrimento, como poderiam os seus servos, filhos e membros esperar paz e liberdade quanto à sua carne?” Essa era a convicção do reformador frente às dificuldades no mundo. De fato, o seu contexto de vida não lhe permitiu escrever extensamente uma obra sistemática sobre a fé cristã, mas o seu principal livro marca o legado desse grande homem: ‘O Fundamento da fé Cristã’ que defendia com seu verso bíblico preferido: “ninguém pode lançar outro fundamento além do que foi posto, o qual é Jesus Cristo” (1 Co 3.11).

Os anabatistas são os ancestrais espirituais das igrejas Batistas e Menonitas. A grande contribuição do anabatismo para a igreja evangélica foi a ênfase na conversão através do arrependimento, através de uma experiência pessoal e necessariamente genuína.

REFORMA CATÓLICA

Devido à expansão da Reforma Protestante, com constante perda de fiéis e territórios, somada a crescente insatisfação do clero e dos imperadores católicos, uma resposta era necessária ser dada ao movimento protestante.

O auge da reforma católica se deu com os papas reformistas. O primeiro deles foi Adriano VI, sucedeu-lhe Clemente VII com um governo de nove anos. Os papas Paulo III, Paulo IV, Pio V e Sixto V cobriram um período que vai de 1534 a 1590, e foram os mais zelosos reformistas que presidiram a Santa Sé desde Gregório VII.

As finanças da Igreja foram reorganizadas e os cargos foram ocupados por padres e religiosos de reconhecida fama de disciplina e foram rigorosos com os clérigos que persistiam no vício e no ócio. A ação dos papas reformistas foi completada com a convocação do Concílio ecumênico que se reuniu na cidade de Trento. Os desdobramentos do Concílio foram:

• No campo doutrinal o Concílio reafirmou, sem exceção, os dogmas atacados pela Reforma Protestante, tratando entre outros temas sobre a questão da "justificação" e, contra as teologias luterana e calvinista, ensinou e declarou que "a graça divina e a cooperação livre e meritória da vontade humana operam em conjunto a justificação do homem.", definiu-se ser verdade também a doutrina dos sete sacramentos (batismo, crisma, confissão, eucaristia, ordem sacerdotal, matrimônio e unção dos enfermos).
• O Concílio confirmou, como elementos essenciais da religião católica, como verdades absolutas (dogmas) a transubstanciação, a sucessão apostólica, a crença no purgatório, a comunhão dos santos e reafirmou-se o primado e autoridade do Papa como sucessor de São Pedro.
• No campo disciplinar procurou-se com empenho a por fim nos abusos existentes no clero, e melhorou-se substancialmente a sua formação intelectual e cultural. Um episcopado plenamente dedicado ao serviço das almas, um clero bem formado e de elevada moralidade, foram metas da legislação do concílio.
• A formação do clero se faria nos seminários - tanto cultural como espiritual e obrigou-se aos párocos a ensinar a catequese às crianças e a dar doutrina e instrução religiosa aos fiéis. Os habitantes de terras descobertas foram catequizados através da ação dos jesuítas.
• Retomou-se o Tribunal do Santo Ofício e Inquisição: para punir e condenar os acusados de heresias e todos os outros que não aceitassem a autoridade da igreja romana.

O período que se seguiu ao Concílio de Trento foi marcado por uma grande renovação da vida católica. A reforma fundada nos decretos e nas constituições tridentinas foi levada a efeito pelos papas que se sucederam. Foi criado o "Index Librorium Proibitorium" (Índice de Livros Proibidos) para evitar a propagação de idéias contrárias à fé da Igreja Católica. Todos estes livros proibidos eram queimados, a Igreja Católica proibiu-os de serem lidos. Publicou-se uma Catecismo Romano.

Também são frutos e conseqüência da Reforma Católica levada a efeito pelo Concílio a renovação da arte sacra cristã, com o surgimento do Barroco que é o estilo artístico da Reforma Católica. Portugal e Espanha levaram a fé católica para além-mar. Hoje os católicos da América Latina e das Filipinas constituem a grande reserva demográfica da Igreja e do Cristianismo.

Extraído da Wikipédia 

APLICAÇÃO
Por José Cristiano de Oliveira Sampaio

É interessante mergulhar na história dos desdobramentos da Reforma Protestante porque nos propicia fazer o currículo do movimento evangélico de hoje, com todos os seus frutos, tanto bons quanto lastimáveis. É relevante estudar hoje a Reforma Protestante, pois, a despeito dos fatores sociais, políticos, econômicos e culturais que a engendraram, aquele movimento na Igreja do século XVI foi um mover do Espírito de Deus, o que precisamente dá à Reforma um significado permanente para a Igreja de Jesus. A pergunta a fazer é: como a teologia dos reformadores pode ajudar a Igreja moderna? A Igreja do XVI vivia uma crise espiritual aguda e, com as devidas proporções, ainda é muito semelhante ao que ocorre atualmente no incongruente movimento evangélico no Brasil e no exterior.

A solução encontrada pelos reformadores foi um retorno à Palavra de Deus, Sola Scriptura. Lá encontraram respostas para as suas mais profundas questões. Ao enfatizar o Sola Gratia estavam declarando a impossibilidade de autojustificação humana diante de Deus. As obras autônomas são ineficazes, Sola Fide é o mecanismo com que Deus nos agracia para nos salvar, porque o pecado corrompeu a liberdade de escolha do homem e Aquele que nos quer salvar nos elege em sua infinita soberania; assim, a vida não é vista de forma fatalista, mas como totalmente dependente d’Ele. Solus Christus destaca o senhorio de Cristo sobre a nossa salvação e sobre o todo do universo, pois tudo foi criado por Ele e para Ele, sendo Jesus o único mediador entre Deus e os homens. Diante da inefável grandeza de Deus que nos ama, somente podemos reconhecer que só a Ele é devida a glória. Dado que um neopelagianismo e o orgulho religioso nos cercam no meio evangélico, a mensagem dos reformadores ainda é muito pertinente, Soli Deo Gloria.

MEMORIZAR VERSÍCULO
Mas ainda que nós ou um anjo do céu pregue um evangelho diferente daquele que lhes pregamos, que seja amaldiçoado! Gálatas 1:8.
QUESTÕES
Quais as divergências dos reformadores com os anabatistas?
____________________________________________________________________

Qual foi a reação da igreja Católica frente aos desdobramentos da Reforma Protestante?
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Como esses movimentos de “correção” reformaram a Igreja?
____________________________________________________________________

Como a teologia dos reformadores pode ajudar a Igreja moderna?
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MATERIAL UTILIZADO
• Cairns, Earle E. O Cristianismo Através dos Séculos, São Paulo 2008. Editora Vida Nova.
• Textos de José Cristiano de Oliveira Sampaio escritos especialmente para a comemoração da Reforma Protestante no ano de 2010. Publicados originalmente no boletim da Igreja Esperança/BH.

• Movimento Reformado, por Alderi de Souza Matos. Universidade Mackenzie 
• Williams, Terri. Cronologia da História Eclesiástica, São Paulo 1993. Edições Vida Nova.
• Wikipédia - Contra-Reforma Católica <http://pt.wikipedia.org/wiki/Contrarreforma>

domingo, 7 de agosto de 2011

SEGUINDO O ESPÍRITO

A História do Cristianismo Através dos Séculos (aula 24)


TEXTO BASE: Atos 16:6-17:15

Deus havia marcado encontros para Paulo com algumas pessoas na Macedônia. O primeiro foi com Lídia, à margem do rio num sábado à tarde. O segundo foi com uma escrava que ganhava dinheiro para seu dono adivinhando o futuro, e o terceiro foi com um carcereiro e sua família em Filipos. Não foi fácil levar Paulo a esses encontros, mas o Espírito Santo o fez chegar lá. Para isso ele fechou algumas portas – e abriu outras.

Não temos de implorar ao Espírito Santo para que nos guie. Mas como Paulo, devemos procurar essa orientação enquanto somos fiéis ao que já sabemos ser a vontade de Deus, pois confiamos em Deus mesmo quando não conseguimos explicar o que ele está fazendo.

"Creia no Senhor Jesus, e serão salvos, você e os de sua casa". Atos 16:31

A aula foi extraída do guia de estudos bíblicos: O Espírito em ação – John Stott, Editora Cultura Cristã