domingo, 22 de maio de 2011

Igreja no apogeu da Idade Média (História da Igreja IV)

Por Pedro Paulo Valente

A História do Cristianismo Através dos Séculos (aula 13)

TEXTO BASE: II Tm 3:14-17

INTRODUÇÃO
Nos séculos XII e XIII, o cristianismo na Europa ocidental foi marcado por um zelo religioso que se manifestou em termos de participação em movimentos de cruzadas e reformas. Sobre a bandeira da Igreja Romana muitos cristãos batalhavam por motivos religiosos contra mulçumanos e hereges, enquanto movimentos de reformas eram ensaiados através das ordens monásticas e dos cristãos leigos (que não faziam parte do clero). Embora fosse um período de ardor espiritual, poucos sabiam o que estavam fazendo, uma vez que as Escrituras estavam distantes dos cristãos, ao passo que o poder por trás do trono papal não parava de aumentar.

SUPREMACIA PAPAL
No período de 1054 a 1305 d.C. três papas se destacaram num período que o papado se impôs como autoridade suprema para governar o mundo inteiro e a Igreja.

• Gregório VII (1023-1085) o primeiro a reivindicar o direito de supremacia papal sobre toda forma de autoridade, inclusive sobre imperadores e reis.
  • Defendia que a eleição dos papas deveria ser feita pelo clero.
  • Ele via o papa como vice-regente de Deus e não queria o poder civil dominando a Igreja, ao contrário, acreditava que a Igreja deveria controlar o poder civil.
  • Promoveu a obrigatoriedade do celibato clerical para criar uma classe de homens leais ao seu supervisor espiritual, o papa.
 • Inocêncio III (1160-1216), quem elevou o papado medieval ao apogeu de seu poder, tendo enfrentado e humilhado os soberanos das nações emergentes (França e Inglaterra) e do Sacro Império Romano que haviam desafiado sua autoridade.
  • Promulgou a doutrina da transubstanciação. O ensino de que a substância do pão e a do vinho se transformava no corpo e no sangue real de Cristo após as palavras de consagração dos sacerdotes. Desse modo, o sacerdote celebrava um sacrifício sempre que dirigia uma missa.
  • Achava que a autoridade os reis e príncipes derivavam dele, podendo ele mesmo excomungá-los, depô-los ou colocar até mesmo o Estado sob interdito, que proibia ao clero de celebrar todas as cerimônias essenciais da Igreja. O papa estava acima do homem e abaixo de Deus.
• Bonifácio VIII (1235-1303), o último a gozar do exercício da supremacia papal, tendo sido humilhado por parte do poder temporal (rei da França).
  • Promulgou a bula papal conhecida como Unam Sanctum. Nela dizia que não se pode encontrar “salvação nem remissão de pecados” fora da Igreja Romana, que o papa como chefe da Igreja Romana tinha autoridade espiritual e temporal sobre todos e que a submissão papal era “necessária para a salvação”.
 AS CRUZADAS
Durante os anos de 1095-1291 d.C. os cristãos da Europa Ocidental realizaram diversas cruzadas contra os mulçumanos na Palestina. Deve-se ter em mente que apesar dos cruzados terem interesses econômicos ou políticos, o motivo primeiro das Cruzadas era religioso.

A causa direta da Primeira Cruzada foi a pregação de uma Cruzada contra os mulçumanos feita pelo papa Urbano II em 1095. Ele propôs a Cruzada como resposta ao pedido de ajuda feito por Aleixo (Imperador de Constantinopla) um ano antes, com a idéia de libertar os lugares sagrados dos mulçumanos e ajudar o Império do Oriente. A multidão reunida, composta principalmente por franceses, respondeu com um entusiástico “Deus o quer” à proposta de Urbano.

Foi tão grande o entusiasmo que massas de camponeses começaram a marchar através da Germânica, Hungria e os Bálcãs em direção à Palestina. Porém sem organização e sem disciplinam essa desorganizada cruzada popular foi massacrada pelos turcos ou feitos prisioneiros e vendidos como escravos.

Já a Primeira Cruzada organizada, dirigida pelos nobres da França, Bélgica e Itália movimentaram perto de 1 milhão de pessoas que participaram de atividades ligadas a Primeira Cruzada. Num período de 3 anos (1096-1099) eles conquistaram Nicéia, Antioquia e Jerusalém, tendo a criação de estados feudais como resultado principal.



Ao todo foram 8 Cruzadas num período de 200 anos. A Cruzada das Crianças de 1212 foi o episódio mais triste. Ela ocorreu entre a Terceira e a Quarta Cruzada e foi um movimento extra-oficial, baseado na crença que apenas as almas puras (no caso as crianças) poderiam libertar Jerusalém. 50 mil crianças foram colocadas em navios, saindo do porto de Marselha (França) rumo a Jerusalém. O resultado foi um desastre, pois a maioria das crianças morreu no caminho, de fome ou de frio. As que sobreviveram foram vendidas como escravas pelos turcos no Norte da África. Algumas chegaram somente até a Itália, outras se dispersaram, e houve aquelas que foram seqüestradas e escravizadas pelos muçulmanos.

As Cruzadas deixaram importantes conseqüências políticas e sociais na Europa ocidental. Vejamos algumas:
  • O feudalismo se enfraqueceu porque muitos cavaleiros e nobres que saíram como cruzados jamais voltaram e também, porque muitos venderam as suas terras para financiar as campanhas. Com isso os reis puderam aumentar o seu controle, favorecendo uma nação-estado fortemente concentrada em um monarca a fim de criar condições de segurança e ordem tão necessárias aos negócios da classe média.
  • O papado aumentou seu prestígio durante as Cruzadas, embora as campanhas tenham levado ao surgimento de um sentimento nacional que, a certa altura, enfraquecera o poder papal nas nações-estados.
  • A persuasão substitui a força como técnica de negociação com os mulçumanos. E alguns movimentos missionários para o mundo árabe surgiram, como a escola de missões criada por Raimundo Lullo em Miramir (Espanha, 1276).
  • As cidades italianas, lideradas por Veneza, começaram a comercializar com o Oriente produtos de luxo, como tecidos, temperos e perfumes.
  • A filosofia, a ciência e a literatura árabe chegaram à Europa ocidental e foram estudadas pelos escolásticos, que tentaram fazer uma síntese entre esse saber e a revelação cristã.

Sugestões:

1.Para conhecer cada uma das Cruzadas visite Wickipédia

2.O filme Cruzadas, com Orlando Bloom conta a história entre a Segunda e a Terceira Cruzada, uma ótima forma de visualizar a História (apesar do romance distorcido).



MONASTICISMO
Muitas novas organizações surgiram no século XII como expressão do mesmo ardor religioso manifesto nas Cruzadas e na grande onda de construção de catedrais.

As Ordens Dominicana e Franciscana surgiram como respostas ao problema de trazer os mulçumanos e os hereges a fé pela persuasão, através da educação ou do esforço missionário. O zelo espiritual das Cruzadas provocou a fundação de ordens militares leigas. Todas essas ordens submetiam-se voluntariamente ao papa, sendo que o voto de obediência incluía a obediência ao papa e ao abade ou chefe da ordem. O movimento também satisfez o desejo medieval por uma vida ascética (renuncia do prazer em busca da espiritualidade) e permitiu aos interessados uma oportunidade de se engajarem em estudos de erudição.
  • Ordem cisterciense – foi fundada por um monge beneditino de nome Roberto, em Citeax (França, 1908). Os monges cistercienses davam grande ênfase na autonegação ascética, na simplicidade arquitetônica de suas construções e na organização centralizada. Eles davam mais atenção a agricultura do que as ocupações escolásticas.
  •  Ordens militares – um tipo de monasticismo que combinava a arte da guerra com a vida monástica. A ordem dos Cavaleiros Hospitalários (ou de São João) foi fundada no começo do século XII para defender os peregrinos e cuidar dos doentes. No início de sua história era equivalente a Cruz Vermelha de hoje, porém mais tarde a ordem tornou-se uma organização estritamente militar para defender dos pagãos a Terra Santa (Palestina). Os Cavaleiros Templários foram organizados em 1118, e adotaram a regra cisterciense de vida monástica, dedicados a defender a Terra Santa dos cruéis assaltos dos mulçumanos.
  •  Os frades – o nome frade vem do latim frater e significa irmão. Eles prestavam votos de pobreza, castidade e obediência; entretanto, em vez de viverem em comunidades monásticas para trabalho e oração separadas do mundo, eles viviam entre o povo das cidades para servi-lo e para pregar ao povo na sua língua (as missas eram realizadas em latim). Os mosteiros tinham propriedades e se auto-sustentavam pelo trabalho, já os frades se mantinham graças às doações e esmolas recebidas do povo. Destacam-se os frades franciscanos (Ordem fundada por Francisco de Assis, 1182-1226) e os dominicanos (Ordem fundada por Domingos, 1170-1221). Enquanto os franciscanos foram grandes missionários, convertendo os homens pelo exemplo e pelo apoio emocional, os dominicanos foram grandes eruditos que tentaram converter os homens da heresia através da persuasão intelectual. O apelo dos dominicanos era à cabeça do homem, enquanto o dos franciscanos era ao coração.
PENSADORES CRISTÃOS - ESCOLASTICISMO
A Igreja pode praticar a separação da cultura, ou pode praticar a síntese. Os escolásticos optaram pela síntese. Começando nas escolas de catedrais e de mosteiros, o movimento se expandiu com o surgimento das universidades européias no século XIII. O termo “escolasticismo” e “escolástico” vêm da palavra grega schole, que significa o lugar onde se aprende.

O escolasticismo pode ser definido como a tentativa de racionalizar a teologia para que se sustente a fé com a razão. Eles reconciliavam a filosofia, conquistada por processos racionais, com a teologia especial revelada da Bíblia, aceita pela fé.

Os escolásticos não estavam interessados em buscar a verdade, mas em organizar racionalmente um corpo de verdades aceitas, para que, vindo a verdade da revelação através da fé ou da filosofia através da razão, pudesse constituir um corpo harmônico. Para eles, os dados ou o conteúdo de seu estudo estavam fixados definitivamente e absolutamente.

Tomás de Aquino (1225-1274)

Tomaz de Aquino foi sem dúvida o grande nome desta época. Vindo de berço nobre, fez-se monge dominicano e dedicou-se a estudar. Sua grande obra foi Summa Theologiae, na qual procurou harmonizar as áreas da fé e da razão numa totalidade de verdade. Como ambas vêm de Deus, não pode haver contradição entre elas, dizia Tomás.

A Summa Theologiae consiste em 3000 artigos, com mais de 600 questões em três grandes seções. Ela pretendia ser uma exposição sistemática de toda a teologia. Tornou-se, então, a exposição clássica do sistema da Igreja Católica Romana.

Surgimento das universidades
Como centro de ensino e pesquisa a universidade começou por volta de 1200. Em 1400 havia mais de 75 universidades em toda Europa. Embora já existisse o ensino de nível superior, com a criação das universidades a maior parte da educação deixou de ser centralizada nas escolas monásticas e catedrais. As universidades de Oxford e Cambridge datam dessa época.

APLICAÇÃO
Por muitas vezes a igreja institucionalizada confundiu sua missão no mundo. Sempre que isso ocorreu dois fatores sempre estiveram diretamente ligados a essa confusão, o primeiro foi o distanciamento das Escrituras e o segundo foi a ambição pelo poder.

O apóstolo Paulo nos diz na sua segunda carta a Timóteo que a Escritura é inspirada por Deus, contendo em si mesma toda autoridade para nos ensinar, repreender, corrigir e nos educar na justiça. Toda vez que nos afastarmos dela e tentamos substituí-la por qualquer outra fonte de revelação estaremos correndo sérios riscos de nos distanciarmos de nossa missão, de substituir a promoção da verdade pelo engano, da justiça pela injustiça, do amor pelo ódio e a intolerância (II Tm 3:16-17). Devemos lembrar que a Igreja primitiva permanecia na doutrina dos apóstolos (Bíblia) e por isso era bem sucedida na sua missão de proclamar e promover o reino de Deus (Mt 5:13-16).

O poder é uma tentação que todos nós estamos sujeitos, é o desejo de querer dominar e subjugar o próximo aos seus caprichos e desejos. Jesus, embora sendo Deus, na sua encarnação foi tentado pelo diabo quanto ao poder (Mt 4:8-11), mas não se submeteu a sua tirania. Simão, um mago que havia se convertido, desejou o poder do Espírito Santo que estava sobre os apóstolos e inflamando seu coração de maldade sugeriu comprá-lo para dominar sobre seus conterrâneos (At 8:9-24). Paulo nos lembra que muitos homens perversos e impostores irão de mal a pior, ora enganado e ora sendo enganados, nessa corrida louca pelo domínio (II Tm 3:1-13). Jesus nos lembra que no reino de Deus não existe esta disputa de poder, o maior deve ser como o menor, quem preside deve servir e quem se exaltar será humilhado (Mt 23:11-12; Lc 22:24-27).

QUESTÕES
Quais as conseqüências do papado para o cristianismo?
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Como e por que os cristãos se envolveram com as cruzadas?
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Quais as contribuições do monasticismo ao cristianismo e ao mundo?
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Você concorda com essa frase de John Stott: crer é também pensar? E o lema da ABU: fé que pensa e razão que crê?
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Qual o lugar das Escrituras na fé cristã?
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MATERIAL UTILIZADO
  • Cairns, Earle E. O Cristianismo Através dos Séculos, São Paulo 2008. Editora Vida Nova.
  • Williams, Terri. Cronologia da História Eclesiástica, São Paulo 1993. Edições Vida Nova.

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